Ela acordou às 16h40min. Tinha tentado assistir à Sessão da Tarde, mas o filme deu sono. Era muito urbano. Tirou o pijama cor de rosa desbotado. A transparência que o tecido carregava era de tanto ter sido usado. Na última porta do armário, detrás das blusas de tricô, tirou o uniforme da escola em que estudara durante onze anos. Vestiu.
Na cozinha, pegou da fruteira amarela uma maçã. Na mochila azul, pôs a agenda e guardou a fruta metade vermelha, metade verde.
Desceu as escadas, abriu o portão da garagem e entrou no 147. Era velho e arranhado, quase todo original. Não que ela se importasse. Gostava da função que ele tinha e como bem a atendia. Com poucas manobras, tirou-o da garagem e foi em direção à escola.
Chegou eram 17h12min. Queria curtir a turma dos “pequenos” saindo. Botou a mochila e saiu do Fiat. Enquanto aguardava a sineta bater, às 17h35min, a “saída dos grandes”, ela puxou do bolso externo da calça um amarrador de cabelo feito com a barra da meia fio15 da mãe. Tirou o par, que amarrava os cabelos. Dividiu os fios castanhos ao meio e amarrou em duas vezes.
Um ônibus chegou. Ela esperava o segundo.
Bateu. A segunda lotação chegou. Misturada aos uniformes dos colegas ela atravessou a movimentação na rua e embarcou no ônibus. Depois de uns dez bancos ainda vazios, ela sentou. Escorou a cabeça, na janela, claro.
O ônibus começou a rodar. O olhar deixou-se levar. Vagou pela paisagem dourada dos parreirais que contornavam a estrada estreita e sinuosa. Um capitel a Santo Antonio e pequenas casas com jardins de rosas quebravam a visão contínua da natureza. Cães e gatos misturavam-se às galinhas em uma das moradias.
Quando avistou a vinícola, de súbito, desgrudou a cabeça da janela. Puxou a campainha repentinamente e, um pouco desequilibrada, segurou a corda por longo tempo.
Com a mochila escorrida em um dos braços, titubeou pelo corredor. Entregou a passagem para o motorista e desembarcou. Ajeitou a mochila nas costas e respirou fundo aquele ar puro da colônia. A noite descia.
Andou durante oito minutos pela estrada de terra e pouco cascalho. Ouviu ao longe o ta-tá. Mais perto, avistou a casa de tijolo à vista. A respiração estava diferente. Na porta, bateu três pequenos socos. Recebida pela Giuditta, matou. A saudade, claro.
sábado, 30 de maio de 2009
terça-feira, 19 de maio de 2009
Morando no ar
A pequena e colorida casa da menina ficava à beira de uma longa estrada de chão. Nem tão distante da árvore que dava amarelas frutinhas, passava todo dia uma Maria Fumaça. Seu Martín passeava em frente à casa todo o sábado. A menina corria e pedia a ele que lhe contasse uma nova história. Naquele sábado, a menina sentia-se especial. Sua mãe fazia um delicioso bolo.
Ela foi até o jardim. Intrínseco com suas rosas azuis. Sentou-se no balanço de metal que havia sido pintado de branco e ficou a esperar seu velho amigo que lhe contaria mais uma história. Então, pôs-se a balançar com força...
Seu Martín apareceu. Com seu rasgado e rebatido sobretudo de lã, sua calça xadrez e sua bota sete-léguas. As botas... Havia vezes em que a menina perdia a atenção da história com o olhar fixo nas botas de Seu Martín. Como ela gostava daquelas botas... Seu Martín, escorado na imensa árvore que nunca havia dado nenhum fruto, esperou que a Maria Fumaça passasse por ali. Os dois não tinham trocado uma palavra sequer. A Maria se foi. O apito cada vez mais longínquo. Não podiam mais ver Maria. Mas a emissão do som daquele apito que se afastava fazia seu olhar permanecer fixo na floresta a qual Maria adentrara, como se, pelo som, pudessem ver o doce trem.
A menina arregalou seus cintilantes olhos verdes para Martín, ele entendeu o pedido e começou:
“Muito bem menina. Hoje, contar-lhe-ei uma última história. Uma curta e última história. A história de uma menina como tu. Cabelos tão compridos quanto os teus. Desejos que aparentavam ser impossíveis... Como os teus. Numa tarde ensolarada de inverno ela decidiu que iria sumir. Foi até o galpão. Procurava os antigos pertences da avó. Revirou o velho beliche. Tirou todas as caixas de brinquedos. Desmanchou as pilhas de cadeiras. E afastou as caixas com as cartas nunca enviadas de seu tio avô. Até que encontrou duas grandes malas de madeira. Tirou o primeiro antiquário. Um vestido verde da década de 50. Vestiu. Foi até a vitrola. Ligou. Billy Holiday. Ficou girando com aquele vestido. Voltou até a mala e tirou outras peças. Não encontrou o livro de magia. Mas no fundo da mala, estava um pequenino frasco colorido. Ela não sabia o que tinha dentro dele. E mesmo assim, o abriu...”
O bolo estava pronto. A mãe da menina foi servi-lo lá no jardim. Quando aproximou-se do balanço, suas mãos deixaram que o bolo caísse aos seus pés. O balanço havia arrebentado. A menina? Havia sumido. A mãe? Correu até os trilhos da Maria Fumaça. Ela não demoraria a passar...
Ela foi até o jardim. Intrínseco com suas rosas azuis. Sentou-se no balanço de metal que havia sido pintado de branco e ficou a esperar seu velho amigo que lhe contaria mais uma história. Então, pôs-se a balançar com força...
Seu Martín apareceu. Com seu rasgado e rebatido sobretudo de lã, sua calça xadrez e sua bota sete-léguas. As botas... Havia vezes em que a menina perdia a atenção da história com o olhar fixo nas botas de Seu Martín. Como ela gostava daquelas botas... Seu Martín, escorado na imensa árvore que nunca havia dado nenhum fruto, esperou que a Maria Fumaça passasse por ali. Os dois não tinham trocado uma palavra sequer. A Maria se foi. O apito cada vez mais longínquo. Não podiam mais ver Maria. Mas a emissão do som daquele apito que se afastava fazia seu olhar permanecer fixo na floresta a qual Maria adentrara, como se, pelo som, pudessem ver o doce trem.
A menina arregalou seus cintilantes olhos verdes para Martín, ele entendeu o pedido e começou:
“Muito bem menina. Hoje, contar-lhe-ei uma última história. Uma curta e última história. A história de uma menina como tu. Cabelos tão compridos quanto os teus. Desejos que aparentavam ser impossíveis... Como os teus. Numa tarde ensolarada de inverno ela decidiu que iria sumir. Foi até o galpão. Procurava os antigos pertences da avó. Revirou o velho beliche. Tirou todas as caixas de brinquedos. Desmanchou as pilhas de cadeiras. E afastou as caixas com as cartas nunca enviadas de seu tio avô. Até que encontrou duas grandes malas de madeira. Tirou o primeiro antiquário. Um vestido verde da década de 50. Vestiu. Foi até a vitrola. Ligou. Billy Holiday. Ficou girando com aquele vestido. Voltou até a mala e tirou outras peças. Não encontrou o livro de magia. Mas no fundo da mala, estava um pequenino frasco colorido. Ela não sabia o que tinha dentro dele. E mesmo assim, o abriu...”
O bolo estava pronto. A mãe da menina foi servi-lo lá no jardim. Quando aproximou-se do balanço, suas mãos deixaram que o bolo caísse aos seus pés. O balanço havia arrebentado. A menina? Havia sumido. A mãe? Correu até os trilhos da Maria Fumaça. Ela não demoraria a passar...
sexta-feira, 8 de maio de 2009
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